Escritas Ocultadas – A Paisagem Que Não Passa

Artista negra insere a memória do povo negro na celebração dos 250 anos de campinas através de ocupação artística

Entre 16 e 25 de julho, diversos pontos historicamente importantes da região central de Campinas receberam uma série de performances que compõem a ocupação artística ESCRITAS OCULTADAS – A PAISAGEM QUE NÃO PASSA. Realizado pela artista Andrea Mendes com curadoria de Sônia Fardin, o projeto, fomentado pelo Edital Federal Paulo Gustavo com apoio e suporte da prefeitura, tem como intuito utilizar a arte para ativar memórias conflituosas e incômodas em espaços que remetem à memória negra e que foram esquecidos ao longo dos 250 anos de Campinas.

A primeira semana contou com três ativações. A primeira foi a performance apresentada na terça-feira (16), “O legado da Princesa”, realizada pelos artistas Andrea Mendes, Bruno dos Santos, Maraisa Raquel, Rosa Sales e Alessandro Oliveira. O cortejo questionou “quantas vidas produziram o legado da princesa d’oeste?”, fazendo um percurso por ruas e monumentos que evidenciam as formas de ocultação dos saberes e conhecimentos negros, destacando locais de resistência e afirmação da presença da matriz africana como produtora da riqueza que fez e continua a fazer o legado da “Princesa do Oeste”. A performance aconteceu na Rua Treze de Maio, antiga rua São José, esquina com as escadarias da Catedral Metropolitana – local marcado no século XIX pela chegada dos negros escravizados em Campinas, sendo o primeiro percurso que faziam após o desembarque na Estação de trem e caminhada até o Largo da Catedral, onde eram expostos e comercializados. Desde a década de 1990, este local se transformou em um ponto de luta antirracista com a Lavagem das Escadarias, que ocorre todos os sábados da Semana Santa, e pela Marcha Zumbi dos Palmares, todo dia 20 de novembro. O cortejo terminou no Monumento ao Bicentenário, celebrativo da Princesa do Oeste, ressaltando que o seu legado, de fato, foi produzido por vidas negras.

Na quarta-feira (17), o largo em frente ao Palácio da Justiça foi palco para “Embaixo do Chão”, performada por Andrea Mendes e Alessandro Oliveira. O espaço foi escolhido porque carrega a memória afetiva de apagamentos. A praça, que antes abrigava a Igreja do Rosário, símbolo da presença organizada de irmandades negras em Campinas e que foi demolida no processo de expansão das ruas do centro, também se apresentou como sítio arqueológico detectado na última reforma da Avenida Francisco Glicério, quando foram encontradas ossadas, que segundo pesquisadores, tratam-se de um cemitério de negros. A igreja centenária e o cemitério que abrigava em seu solo foram apagados em 1956, eliminados da paisagem pela voracidade do capital imobiliário e seus planos imediatistas.

“Tem preto no Museu” fechou a primeira semana de performances da ocupação Escritas Ocultadas. A apresentação, que aconteceu na quinta-feira (18), foi realizada por Andrea Mendes, Thayara Magalhães, Joyce Nascimento, Ewerton Rodrigues, Poli Sales, Helen Aguiar e Thais Selva. O cenário foi a área externa frontal ao Museu de Arte Contemporânea de Campinas e à Biblioteca Municipal Ernesto Manuel Zink. A proposta da performance foi instalar coletivamente a Arte Negra diante dos lugares oficialmente atestadores do fazer artístico contemporâneo para bradar sua presença potente na cidade, em contraposição à sua quase total ausência nas agendas dos museus e centros culturais.

As demais performances seguem na próxima semana. Confira a programação:

23/07 (terça) às 10h – “Cortejo da Perseverança”
Performers: Andrea Mendes e aberto para todas as pessoas. 

Local: R. Antônio Cesarino, 547 – Centro, Campinas – SP, 13015-291 (Início Rua Antônio Cesarino com a Moraes Sales até a Praça do Centro de Convivência)

24/07 (quarta) às 10h – “CorAção”
Performers: Andrea Mendes e Cecília Stelini. 

Local: Largo de Santa Cruz – Cambuí

25/07 (quinta) às 10h – “Dança da Alegria”
Performers: Andrea Mendes, Ana Bia, Graciele Savio e Poli Sales. 

Local: Largo São Benedito (antigo Largo da Alegria)

QUEM FAZ O PROJETO?

Artista: Andrea Mendes
Andrea Mendes é uma artista negra, nascida em Itaberaba (BA) em 1979, residente em Campinas há 28 anos. Graduada em Artes Visuais pela PUC Campinas (SP) e mestre em Relações Étnico-Raciais pelo PPRER/CEFET – Rio de Janeiro (RJ). Transita entre arte e ativismo, explorando temas críticos que permeiam sua vida diária, expondo as fissuras do sistema social brasileiro que ainda reflete estruturas coloniais. Seu “artivismo” envolve experiências corporais com os espaços que ocupa, gerando tensões poéticas. Suas investigações abrangem performance, instalação e pintura em grandes formatos.

Curadora: Sônia Fardin
Historiadora e curadora de acervos visuais, mestre em História e doutora em Artes Visuais pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Moradora de Campinas, foi coordenadora do Museu da Imagem e do Som de Campinas e diretora do Departamento de Memória, Patrimônio e Turismo da Prefeitura Municipal de Campinas. Ativista de movimentos sociais de memória, comunicação e direitos humanos, Sônia também pesquisa o Acervo João Zinclar, colabora com a Casa de Cultura Tainã, e integra a Rede de Memória e Museologia Social de São Paulo, o Coletivo Socializando Saberes e o Centro Cultural Esperança Vermelha. É curadora do Projeto Sobre Sub Solo de autoria da artista Andrea Mendes.

FICHA TÉCNICA:

Artista: Andrea Mendes
Curadoria: Sônia Fardin
Artistas Convidados: Bruno dos Santos, Maraisa Raquel, Alessandro Oliveira, Rosa Sales, Thayara Magalhães, Joyce Nascimento, Ewerton Rodrigues, Poli Sales, Helen Aguiar, Thais Selva, Cecília Stelini, Ana Bia e Graciele Savio.
Produção e Mídias Sociais: Thiago Moreira e Letícia Rosa
Assessoria de Imprensa: Malu Borin
Fotografia: Fabiana Ribeiro
Filmagem: Carlos Tavares
Designer Gráfico: Thiago Moreira